o abacateiro
Sentado em uma forquilha ele cismava e analisava a vida,
do alto de seus dez anos, no alto do abacateiro...
"Já sou grande. Cresci bastante porque como bastante.
Quer dizer, como mais ou menos porque já sou bem forte.
Os mocinhos e os bandidos dos filmes "fazem", então
por que eu não posso "fazer" também?
Acho que se eu "fizer" com ela, não posso deixar ninguém ver ..."
A década de cinquenta foi palco para sua infância.
O Rio de Janeiro era uma cidade onde um
menino de dez anos podia brincar em suas ruas
sem perigo de sequestros, balas perdidas,
assaltos e outras coisas mais, que hoje
são o tormento dos cariocas. Naqueles tempos
as preocupações eram outras...
Observador atento, buscava seguir os exemplos
de seus heróis nos filmes, tais como
Roy Rogers, Zorro, Flash Gordon, Fantasma e outros
mais, inclusive Jerry Lewis em suas engraçadas
comédias. O poder de sedução que eles
tinham ele os queria ter. Mas era óbvio que para
isso, ele teria que "fazer" aquilo que eles "faziam".
Os cartazes espalhados pelas ruas da cidade e
as propagandas nos bondes, aumentavam
cada vez mais sua vontade de "fazer". Reuniu os
seus amigos e trocaram idéias sobre qual
seria a melhor maneira de "fazer"
aquilo e propôs a eles que todos começassem a
treinar para que impressionassem as meninas
quando fossem namorá-las.
"Então tá combinado: vamos para casa
treinar, mas não esqueçam que ninguém pode ver.
Acho que no banheiro é mais seguro."
Até que não era difícil "fazer" pois já haviam visto escondido
muitos filmes. Cansava um pouco a mão, mas era gostoso.
O treinamento causava muito, muito prazer, só
em pensar como seria "fazer" de verdade, pois essa
nova experiência com certeza deixaria as suas
namoradas com desejo de "fazer", tal como as
mulheres dos filmes. A pose, o jeito de mover o corpo
e as mãos, era essencial e no início exigia muita
concentração para atingir o objetivo.
Xi, ele estava excitado de novo...
" Mais uns dias e é meu aniversário. Onze anos, onze!
Preciso pensar em alguém que me diga como
conseguir para "fazer" e impressionar as meninas. Pais,
nem pensar! Tios, tias, avós e avôs também não.
Mas pera aí... tem aquela tia que tenho certeza vai me ajudar! "
No fim de semana antes de seu aniversário,
sua tia veio visitá-los. Ele conseguiu um jeito de
ficar à sós com ela e bem escondido de todos,
contou-lhe seus planos pedindo que ela o ajudasse
guardando segredo. Explicou que a vontade que
tinha de "fazer" era muita e que o treinamento
foi muito bem sucedido. Ele tinha certeza que
impressionaria muito as namoradas ao "fazer".
Sua tia prometeu ajudá-lo e que guardaria segredo.
Viria à sua festa e seu pedido atendido, seria
o seu presente. Satisfeito com a promessa, sempre
que podia treinava com mais intensidade os
movimentos da mão e do corpo para "fazer" bem e
deixar as meninas mais apaixonadas,
igual seus heróis o faziam.
Dia de seu aniversário. Ansioso esperava pela tia.
Todos chegavam com presentes,
abraços e beijinhos (argh!), menos sua tia. Foi a última
a chegar, quase no final da festa. Ao ver a
ansiedade dele, ela dirigiu-se ao centro da sala,
pediu a atenção de todos e começou a falar:
---
"Você hoje faz onze anos, já é um homenzinho.
E como você me pediu e eu prometi, trouxe
o que você queria ganhar. Agora você vai
finalmente poder "fazer" e impressionar as meninas."
Rapidamente, pegou seu presente, rasgando
trêmulo o papel, coração aos pulos, já pensando
em "fazer" o que seus heróis faziam. Mas, a decepção...
"Assim não vale! São de chocolate!"
E foi para seu quarto, sem agradecer e aos
prantos, para curtir sua grande decepção...
prantos, para curtir sua grande decepção...
carlos miranda (betomelodia) ™
fontes
imagens: arquivo pessoal - texto: carlos miranda (betomelodia)
base das pesquisas: arquivo pessoal / meus escritos